Tia, me dá um biscoito?

Hoje eu gostaria de compartilhar com vocês a experiência que tive essa semana e gostaria também que vocês refletissem comigo se a atitude que eu cometi foi errada ou ingênua ou louca ou...sei lá. No primeiro momento eu me senti muito ingênua e muito burra. Fiquei apavorada. Depois eu pensei que fiz o que meu coração pediu e que eu poderia estar certa. Afinal, não tinha como eu saber se era ou não era. Eu ainda não sou o tipo de pessoa que julga alguém marginal pela aparência, principalmente se esse alguém for uma criança. 

Enfim.. vamos aos fatos...

Estava saindo de casa, no início da tarde, para pagar uma conta de inglês. Ao lado da portaria do meu prédio, tem uma mercearia pequena, dessas que vende: bala, biscoito, chocolate, sucos, etc...Estava passando por ali para atravessar a rua quando vi um menino de no máximo 13 anos ser ignorado por uma senhora que passou e virou a cara. Eu ia fazer o mesmo que a senhora, quando ele olhou nos meus olhos e pediu um biscoito.

- Tia, compra um biscoito pra mim? - Ele estava vestindo uma roupa muito simples, blusa vermelha e bermuda preta e um chinelo de dedo beem velhinho.

Eu quase passei correndo sem nem olhar para ele, quando parei e perguntei de novo o que ele queria. Foi um impulso muito grande. Afinal, eu tinha saído de casa com o compromisso de pagar uma conta e depois talvez tomar um sorvete, já que o dia estava quente e bonito.... Naquele momento que ele pediu de novo o biscoito, mil coisas se passaram pela minha cabeça e eu pensei duas vezes até aceitar. Até que decidi comprar, já que eu tinha dinheiro na carteira e estava em frente a mercearia. Ele poderia ter me pedido um trocado, poderia ter tentado me assaltar, sei lá.... mas ele me pediu comida. Tantas vezes passo por alguém na rua que está pedindo dinheiro, pedindo comida e sempre me arrependo por não ajudar aquela pessoa. Por que a correria do dia a dia faz com que essas pessoas virem rotina na nossa vida sem que a gente faça absolutamente nada para ajudá-las. Então, fui comprar o biscoito para o menino.

Já me assustei quando vi a cara do Dono da mercearia que me olhou com sinal de desaprovação cochichando "Olha só o que você me arrumou, menina". O menino sem nem entrar na mercearia pediu o biscoito para o moço e quando eu vi tinha um outro do mesmo tamanho que ele, com a roupa ainda mais desbotada, me pedindo um biscoito também.

-Tia, compra um pra mim também, por favor? - Quando eu disse que comprava, o menino abriu um sorriso que partiu meu coração e chegou a dar pulinhos de alegria. Eu fiquei com pena dele...

Gente, como que eu ia negar o biscoito pra um e comprar para o outro? Eles pediram o biscoito mais simples da loja (eu acho)... Entrei na lojinha para pagar a senhora que fica no caixa. Enquanto isso, o Dono começou a expulsar os dois meninos de frente da loja. Um deles até chegou a pedir um guaravita também, mas eu fiquei até sem graça de comprar para eles, por que senti que não estava sendo bem vinda no lugar. No meio dessa confusão, apareceram mais dois meninos, um pouco maiores, tentando tirar os menores de frente da loja ou perguntando o que estava acontecendo ( eu não consegui captar todos esses detalhes). Os meninos saíram da loja e eu fiquei lá ouvindo o sermão do Senhor e da Senhora que são donos, irritadíssimos, descascando em cima de mim (na frente de mais dois clientes). Eu fiquei até com vontade de chorar ali, por que tentei fazer uma boa ação e fui vista como burra ou sem noção. Falaram que eles eram todos marginais, que eu não deveria ter feito isso, que eles estão enchendo o saco todos os dias, que isso e aquilo... A senhora dizendo que não merece passar por isso, por que já tem tantos anos e não tem mais saúde para aguentar. Disseram também que eles são todos viciados e trocam o biscoito por dinheiro pra comprar craque depois e etc... falaram muito. Eu fiquei chocada...

Não vou ser ingênua e dizer que isso é mentira. Eu sei que isso existe sim. Infelizmente, no nosso país, muitas crianças são vítimas desse absurdo...Muitas crianças agem como marginais sem nem saberem direito o que estão fazendo, simplesmente por terem nascido dentro dessa realidade. Porém, não é por saber que isso existe, que eu vou pré-julgar todo ser humano que eu encontrar na rua como marginal - principalmente se for uma criança. Meu Deus, se isso for burrice minha ou ingenuidade ou, sei la o quê você queira chamar, eu prefiro continuar sendo assim. Infelizmente, ou felizmente, eu sempre espero o melhor das pessoas. Não é sempre que eu sinto medo quando vejo alguém diferente de mim na rua. Por que para me assaltar, me matar, me roubar, não precisa ser "preto" e mal vestido - isso é o que a sociedade nos diz. E infelizmente, ainda é um preconceito inconsciente de todos nós.

Naquela hora, não passou pela minha cabeça nada disso. Passou pela minha cabeça que eu estava bem vestida, com algum dinheiro na carteira, saindo da minha casa confortável, indo comprar um sorvete ou o que eu quisesse e que na minha frente, tinha um menino de uma realidade que eu não faço a menor ideia de como é - talvez só ele saiba - pedindo um pacote de biscoito. Por que eu iria dizer não? E se fosse realmente uma criança com fome? E se não fosse um marginal...  Se ele for, só peço a Deus que tome conta dele, para que ele possa aprender a seguir o caminho certo na vida.

Confesso que depois de tanto ouvir dentro daquela mercearia, sai de lá com medo. Eles tinham atravessado a rua e, quando vi, resolvi não atravessa-la e passar pela rua de trás. Talvez eles fossem mesmo me assaltar ou talvez eles não fossem fazer nada. Eu nunca vou saber.







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